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Destaque Entrevista

Para o Procurador do MPT Rodrigo Castilho, precarização trabalhista é grave ameaça de retrocesso social em direitos e garantias constitucionais dos trabalhadores

Em entrevista exclusiva ao Jornal A Voz do Motoboy, ele explica o que pode acontecer se nada for mudado.

09/04/2024 15h54 Atualizada há 5 meses
Por: Jornal A Voz do Motoboy Fonte: Jornal A Voz do Motoboy
Divulgação
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O Procurador do Ministério Público do Trabalho de São Paulo (MPT-SP) 2ª Região, Rodrigo Barbosa de Castilho, participou de importante audiência pública por meio dos Grupos de Atuação Especial Trabalhista da CODEMAT – Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente do Trabalho e da Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora e CONAFRET – Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho, para desenvolver um diagnóstico que possa subsidiar e orientar políticas públicas para a saúde dos trabalhadores de aplicativos digitais.

 

Castilho, atua nos temas relacionados a fraudes nas relações de emprego e foi pioneiro no MPT-SP ao ajuizar uma ação contra as empresas de aplicativos para que fosse garantido o vínculo trabalhista.

 

Abaixo, você confere na íntegra, entrevista cedida com exclusividade ao Jornal A Voz do Motoboy em que ele explica a atual situação de precarização das relações trabalhistas, o combate que o MPT, de uma forma geral, vem realizando contra empresas de aplicativos e, principalmente, as atuações do Supremo Tribunal Federal (STF) anulando sentenças trabalhistas  julgadas, a favor dos trabalhadores, no Judiciário trabalhista.

 

Como o senhor avalia a audiência pública realizada no dia 3 pelo Ministério Público do Trabalho de São Paulo, em que profissionais do Judiciário trabalhista e trabalhadores de aplicativos de transporte de passageiros e encomendas relataram dificuldades no exercício da profissão?

Avalio como um evento de extrema importante dentro do contexto histórico e cenário jurídico atual. A mobilização social e da categoria dos trabalhadores é fundamental para a participação democrática nos debates públicos e influência nas decisões políticas. O momento atual é muito delicado com grave ameaça de retrocesso social em direitos e garantias constitucionais dos trabalhadores. A audiência pública é o local apropriado para as autoridades públicas dialogar com a sociedade. As demandas sociais carecem de maior interlocução com o governo e o fórum ideal para lhes das visibilidade é justamente a audiência pública.

 

Na prática, qual a sequência de ações dessa audiência e o que mais pode ser feito para que os trabalhadores consigam seus direitos trabalhistas?

As demandas dos trabalhadores foram absorvidas pelas autoridades públicas presentes e serão objeto de encaminhamento. As angústias foram compartilhadas por todos e a percepção foi de que o anseio de cada um é comum. Cada discurso teve sua força de persuasão e será incorporado nas investigações em andamento e em novas frentes que serão abertas. Tivemos a fala de coletivo de mulheres, de representante da categoria dos ciclofretistas e de acadêmicos que estudam as evoluções tecnológicas no setor dos motofretistas. Tudo isso em ambiente plural e dialógico. O MPT sai da audiência pública fortalecido e com subsídios para aperfeiçoar suas investigações e modo de atuação. Me chamou atenção especialmente a fala do professor Manuel Cardoso sobre dispositivo móvel desenvolvido pela Universidade do Estado do Amazonas que aufere a fadiga do trabalhador em tempo real e emite aviso de alerta para informá-lo - e a empresa por ele responsável - de tal estado a fim de evitar acidentes, garantindo sua segurança e a de terceiros.

 

O MPT quer o reconhecimento da relação estabelecida entre o trabalhador e a plataforma digital, com a garantia de direitos sociais trabalhistas, securitários e previdenciários. Inclusive já provou esse vínculo em investigação que durou um ano. Por que as empresas relutam em aceitar isso e recorrem?

O MPT ingressou com diversas Ações Civis Públicas pedido o reconhecimento do vínculo de emprego entre o trabalhador e as plataformas digitais, visando assegurar um patamar mínimo de direitos e garantias. O motivo pelo qual as empresas de aplicativo relutam em reconhecer a condição de empregado a seus trabalhadores e, por consequência, todos os direitos e garantias constitucionais e legais é estritamente econômico. Essas empresas têm faturamento gigantesco, são conhecidas como empresas unicórnios, com valor de mercado acima de 1 bilhão de dólares, porém entendem que o custo econômico e encargos trabalhistas podem impactar suas receitas. Além disso, há a discussão sobre o enquadramento fiscal das empresas de aplicativos. A continuar como empresas de desenvolvimento de software e intermediação de serviços, a alíquota dos impostos a pagar é muito menor que a das empresas de transportes, por exemplo.

 

As empresas de aplicativos já foram acionadas pelo MPT por fraudar normas trabalhistas, além de descumprirem normas de saúde e segurança que regem o trabalho dos motofretistas, mas continuam funcionando. Pagam multas e muitas vezes, fica por isso mesmo. O que deve ser feito para isso acabar e elas respeitarem leis e trabalhadores?

A questão é mais complexa. Dentro da estrutura política do Brasil, os órgãos públicos de fiscalização e repressão fizeram sua parte. O MTE lavrou autos de infração aplicando multas às empresas de aplicativo por descumprimento da lei. O MPT ingressou com ações judiciais pedindo a condenação das empresas de aplicativo por descumprimento da lei. Hoje, a questão está posta ao Poder Judiciário para decidir se essas empresas de aplicativo descumpriram ou não a lei. O STF, como órgão de cúpula do Poder Judiciário, irá decidir, em caráter definitivo e vinculante, essa questão. Recentemente, ao reconhecer à repercussão geral da questão jurídica sobre a relação jurídica dos trabalhadores de empresas de aplicativo, o STF avocou para si o poder de estabelecer um precedente jurídico obrigatório, um padrão de decisão que deverá ser seguido por todos os juízes. O parlamento poderia, em tese, editar uma lei contrária a essa precedente obrigatório, por exemplo, mas esse é um assunto muito delicado que envolve o equilíbrio e a convivência harmoniosa entre os Poderes da República. Me parece que o Governo Federal quis entrar no debate político ao apresentar o Projeto de Lei Complementar sobre os trabalhadores de aplicativo de transporte individual de pessoas. Resta-nos aguardar os próprios capítulos dessa história.

 

Para a 1ª Turma do STF, a conclusão é que não há vínculo de emprego entre motorista ou entregador e aplicativo. Porém, o MPT tem outro entendimento. Sendo assim, porque as opiniões são tão diferentes sobre o mesmo assunto?

Em Direito, tudo é interpretação. Eu poderia dizer, simplificadamente, que o debate jurídico caminha em dois sentidos: 01) a contratação de trabalhador por aplicativo é um novo modo de contratação, porém o trabalho continua igual, sendo que o aplicativo é um instrumento, uma tecnologia nova para contratar trabalhadores 02) o trabalho prestado através de aplicativo é uma nova forma de trabalho diferente de tudo que jamais foi visto e a lei atual não contempla esse trabalho. Para o MPT, o trabalho de entregar uma encomenda ou dirigir um carro já existia antes do aplicativo e a lei brasileira sempre contemplou tais atividades, prevendo direitos, deveres e obrigações aos trabalhadores e às empresas. Os aplicativos apenas facilitaram a contratação dos trabalhadores e a prestação do serviço que, atualmente, é mais simples e rápida. Além das questões jurídicas, há também um debate político e social sobre o futuro do trabalho, a flutuar conforme as convicções ideológicas de cada um.

Por conta dessa divergência, o presidente da 1ª Turma, Alexandre de Moraes, afirma que há um "reiterado descumprimento" das orientações do Supremo em relação a esse assunto, de vínculo ou não. Como o senhor vê essa opinião dele?

O STF ainda não estabeleceu um precedente obrigatório com força vinculante. Há apenas decisões isoladas de suas Turmas e nenhuma decisão do plenário. Portanto, ainda que as decisões do STF tenham força persuasiva e merecem reverência institucional, não há reiterado descumprimento de decisão vinculante do STF. O que ocorre hoje é que as empresas de aplicativo têm, recorrentemente, apresentado reclamação constitucional ao STF sob o argumento de que decisões judiciais que reconhecem o vínculo de emprego entre trabalhadores e empresas de aplicativo estariam desrespeitando a autoridade das decisões do STF. O STF tem, infelizmente, acolhido essas ações constitucionais e, por consequência, determinado a cassação das decisões judiciais contrárias ao seu entendimento. Eu sustento que decisões não vinculantes do STF nunca poderiam servir de paradigma para cassar uma decisão judicial de instância inferior, pois não há ainda uma tese jurídica fixada pelo STF e cada caso judicial é um caso judicial diferente do outro.

 

E qual a expectativa do MPT em relação a essa discussão que ocorrerá sobre esse assunto, levando em conta que o MPT e o TST já concluíram, em investigações, que há o vínculo de emprego e que as empresas de aplicativos burlam as leis trabalhistas com falsa alegação de serem empresas de tecnologia, quando são na verdade, de transportes?

Para ser bem sincero e transparente, a expectativa é muito ruim. O STF já sinalizou, pela maioria de seus Ministros, que não vê descumprimento da lei e que as empresas de aplicativo são empresas de tecnologia, ou seja, a UBER não seria uma empresa de transporte de pessoas e a IFOOD não seria uma empresa de entregas, por exemplo. O resultado desse entendimento é de que os trabalhadores não são empregados e sim autônomos, trabalham por conta própria e as empresas de aplicativo não teriam nenhuma responsabilidade sobre eles. A vigorar esse entendimento, o impacto sobre o direito do trabalho seria devastador, potencializando os riscos de ruptura do pacto social e prejudicando enormemente os trabalhadores que estariam alijados de todo e qualquer direito e garantia legal.

 

Uma decisão desfavorável ao trabalhador no STF, criando jurisprudência a favor das empresas pode decretar o fim do Judiciário trabalhista?

Não diria o fim imediato, mas poderia ser o início do fim. Minha preocupação é que essa nova forma de contratação se amplie para outros mercados de trabalho. A depender da tese jurídica fixada pelo STF, qualquer atividade e profissão poderia ser contratada por um aplicativo (médico, garçom, professor) sem qualquer direito e garantia social. Se não há relação jurídica de emprego, se poderia construir a tese de que a competência para julgar uma ação judicial que envolvesse um trabalhador de aplicativo seria da Justiça Comum. Sem dúvida, nesse contexto, a Justiça do Trabalho sairia muito enfraquecida, em estágio terminal.

 

Na Europa, as decisões tem sido em favor dos trabalhadores de aplicativos, enquanto que, no Brasil, pelo menos até aqui parece que as empresas estão na vantagem tendo sentenças do Judiciário derrubadas pelo STF. Como se explica isso, pelo olhar do MPT?

Inexplicável, principalmente considerando que o Brasil sempre foi a vanguarda e o país paradigma de proteção ao trabalho e aos trabalhadores. Posso afirmar que o Brasil caminha na contramão do mundo.

 

As empresas de aplicativos estão proibidas de utilizar os sistemas automatizados para exercer pressão indevida sobre os trabalhadores ou que ponham em risco a segurança e a saúde física e mental dos trabalhadores. Entretanto, usam e abusam de promoções de incentivo proibidas pela Lei Federal 12.436. Quem deve fiscalizar essa atitude das empresas?

Essa questão foi objeto das ações judiciais do MPT, inclusive para sustentar que não há autonomia do trabalhador e sim uma gestão e controle da mão-de-obra por parte dos aplicativos. O algoritmo dita o ritmo de trabalho e organiza a mão-de-obra, oferecendo incentivos, promoções, prêmios, estabelecendo o preço do serviço e distribuindo as viagens de acordo com a sua conveniência. Trata-se de um sistema de gamificação, no qual o trabalhador não tem controle sobre sua própria vida, rotina de trabalho, informação. O aplicativo assume todo o controle, principalmente dos dados pessoais e sensíveis do trabalhador. Como chamar esse trabalhador de dono do seu negócio? A Lei citada tem uma razão de ser: proibir o excesso de velocidade e garantir a segurança nas vias públicas. É estarrecedor que o argumento das empresas de aplicativos de que não precisam observar a Lei Federal sobre transporte motociclista porque não são empresas de transporte e sim de tecnologia.

 

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